sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Mascarar para revelar

Abundantes no carnaval, as máscaras são peças valiosas no teatro. Há duas décadas o Grupo Moitará desenvolve ações e pesquisas pioneiras sobre estes artefatos.
Adriano Belisário

Pioneiro na pesquisa de máscaras no Brasil, desde a confecção até sua utilização, o Grupo Moitará vê no objeto muito mais do que um adereço festivo. Ele é peça-chave da pedagogia dramatúrgica do coletivo, que tem um acervo de dezenas de máscaras feitas artesanalmente. Hoje, o grupo prepara-se para ir a São Paulo apresentar o espetáculo Quiprocó, com texto escrito coletivamente e a base de improvisações com os atores.

Fundador do Moitará ao lado da atriz Érika Rettl, Venício Fonseca vai longe quando se trata de discutir a origem das máscaras. “Na era paleolítica, os homens se travestiam de animais e mimetizavam comportamentos para se aproximar das caças. A máscara acompanha a história do homem e também está presente fora do teatro. A de carnaval, por exemplo, tem a função de esconder para permitir a transgressão”, diz o diretor de Quiprocó.

Mas as influências do grupo são mais recentes. Criada no século XVI, a commedia dell'arte é uma delas. Este tipo de teatro fazia uso intensivo das máscaras nas apresentações populares que viajavam a Europa. Porém, em meados do século XVIII, a commedia dell’arte foi assimilada pelos nobres. As apresentações passaram a ocorrer nos palácios e o gênero perdeu muito da crítica social, contribuindo para seu declínio.

No período após a Segunda Guerra, o escultor Amleto Sartori iniciou uma retomada das máscaras da commedia dell’arte, ao lado de nomes como Jacques Lecoq, Jean Louis Barrault, Giorgio Strehler, Dario Fo e Brecht. A difusão é levada adiante por seu filho, Donato Sartori. “Já trabalhava com máscara, mas de forma empírica. Quando tive contato com Sartori e outros pesquisadores, começamos a trabalhar com a pesquisa também”, afirma Venicio.

Passo a passo
No Moitará, o trabalho com novos atores começa com exercícios físicos. O primeiro contato com os disfarces se dá através da chamada máscara neutra. Influência do teatro oriental, sua aparência é simétrica e não remete a nenhuma característica particular. Ao contrário, “ela não é um personagem, mas um estado. Não tem memória, nem conflitos”, explica Venicio.

A próxima é a máscara abstrata. Com formas geométricas, ela permite ao ator trabalhar o ritmo do corpo. É seguida pela máscara larvária, que já apresenta uma sugestão de um personagem, mas ainda de forma incipiente. Os traços são como esboços, que podem misturar a aparência humana com a animal. Já a máscara expressiva revela um arquétipo mais definido, com uma história particular.

Quando familiarizados com os tipos acima, os atores utilizam a meia-máscara, que cobre apenas a parte superior do rosto do ator. Nesta etapa, além das expressões corporais, trabalha-se também a voz do personagem. Há ainda os acentos, que são pequenas modificações que visam dar destaque a certa parte do corpo, como o famoso nariz de palhaço, “a menor máscara do mundo”, segundo Venicio.

“As máscaras são feitas após um longo estudo sobre o arquétipo que se deseja construir, suas características físicas e psicológicas. Por exemplo, se a máscara for usada na rua deve ter volumes maiores para ser visível mesmo longe. Ao contrário, se apresentada próximo ao público, com uma luz direcionada, podemos trabalhar com mais detalhes”, diz o diretor. No site do grupo, é possível conferir imagens e textos sobre as máscaras.

Fonte:Revista de História da Biblioteca Nacional

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